Emanuely Cardoso – Advocacia

Como obrigar o Estado a fornecer medicamentos de alto custo que você precisa

medicamentos de alto custo

O fornecimento de medicamentos de alto custo pelo Sistema Único de Saúde (SUS) constitui uma das principais frentes de judicialização do direito à saúde no Brasil, revelando não apenas a insuficiência estrutural da política pública farmacêutica, mas também a profunda tensão entre as limitações orçamentárias do Estado e a concretização de direitos fundamentais. Essa tensão, no entanto, não pode servir de justificativa para a negação de tratamentos indispensáveis à preservação da vida e da dignidade humana, sobretudo diante da inequívoca determinação constitucional contida no artigo 196 da Constituição Federal, que estabelece a saúde como direito de todos e dever do Estado.

A atuação do Poder Judiciário na tutela desse direito tem sido fundamental para garantir o acesso de pacientes hipossuficientes a tratamentos que, embora não estejam formalmente incorporados às listas oficiais, revelam-se imprescindíveis para o enfrentamento de doenças graves, raras ou de evolução rápida e degenerativa. Em tais casos, a negativa administrativa do SUS não apenas compromete a efetividade do direito à saúde, mas pode configurar verdadeira afronta ao princípio da dignidade da pessoa humana e ao postulado da vedação ao retrocesso social.

O entendimento do Supremo Tribunal Federal e os parâmetros de legitimidade da judicialização

A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, especialmente a partir do julgamento do Tema 793, fixou parâmetros objetivos para a concessão judicial de medicamentos não incorporados às políticas públicas de saúde. De acordo com a tese firmada, é possível a concessão judicial de medicamentos não previstos nas listas oficiais do SUS desde que presentes, cumulativamente, quatro requisitos: (i) a demonstração da imprescindibilidade do medicamento para o tratamento do paciente; (ii) a inexistência de alternativa terapêutica incorporada ao SUS; (iii) a incapacidade financeira do paciente de arcar com o custo do tratamento; e (iv) a existência de registro sanitário do medicamento na Anvisa — salvo situações excepcionais que justifiquem a sua ausência.

Trata-se de uma construção jurisprudencial que, ao mesmo tempo em que evita uma interferência indiscriminada do Judiciário na formulação de políticas públicas, reconhece a necessidade de proteção imediata do direito à saúde em situações concretas, em especial quando há risco de morte ou de agravamento irreversível do quadro clínico. O STF, portanto, tem adotado uma postura de deferência qualificada às decisões administrativas, mas sem abrir mão de seu papel contramajoritário quando se trata da defesa de direitos fundamentais.

Requisitos formais e probatórios para o ajuizamento da ação

A efetivação judicial do direito ao fornecimento de medicamentos de alto custo exige do autor da ação a apresentação de um conjunto probatório robusto e tecnicamente adequado. Nesse sentido, o ponto de partida deve ser um relatório médico circunstanciado, elaborado por profissional especialista na área correspondente à patologia, com a indicação precisa da doença, o histórico do tratamento, a justificativa para a prescrição do medicamento pleiteado e a demonstração da inexistência de alternativas terapêuticas disponíveis na rede pública.

Além do relatório médico, é imprescindível apresentar a prescrição do medicamento com a dosagem recomendada e o tempo estimado de tratamento, acompanhada de três orçamentos atualizados, que evidenciem o alto custo e a inviabilidade econômica do paciente para custear o próprio tratamento. Também se recomenda juntar cópias do RG, CPF, comprovante de residência, cartão do SUS e, sempre que possível, a negativa formal emitida pela Secretaria Municipal ou Estadual de Saúde, o que contribui para reforçar a tentativa prévia de solução administrativa da demanda.

A ação deve ser instruída com pedido de tutela de urgência, especialmente quando a demora no início do tratamento possa implicar risco concreto à saúde ou à vida do paciente. A jurisprudência pátria tem reconhecido, reiteradamente, o cabimento da medida liminar em tais casos, com decisões proferidas em regime de plantão judicial quando configurada a urgência extrema.

A responsabilidade solidária dos entes federativos e os critérios para definição do polo passivo

Um dos temas frequentemente debatidos nas ações envolvendo fornecimento de medicamentos é a definição do polo passivo da demanda. Em consonância com o que dispõe o artigo 23, inciso II, da Constituição Federal, a responsabilidade pela prestação da assistência à saúde é comum entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios. Com base nesse fundamento, o Superior Tribunal de Justiça consolidou o entendimento de que os entes federativos possuem responsabilidade solidária no custeio de medicamentos e tratamentos de saúde, cabendo ao autor da ação eleger livremente contra qual(is) deles ajuizar a demanda.

Na prática, contudo, tem-se verificado que o ajuizamento contra todos os entes — especialmente Estado e Município — pode evitar entraves processuais relacionados à alegação de ilegitimidade passiva ou à ausência de responsabilidade direta. A União, por sua vez, costuma ser demandada nos casos que envolvem medicamentos de uso excepcional, não padronizados, de distribuição centralizada ou de alto custo vinculado à política federal de assistência farmacêutica.

Medicamentos sem registro na Anvisa e hipóteses excepcionais

Outro ponto sensível no contexto do fornecimento de medicamentos é a exigência de registro sanitário na Anvisa. Em regra, conforme reiterado pelo STF no julgamento do Tema 793, é indispensável que o medicamento requerido possua registro válido no Brasil. Todavia, a própria decisão reconhece a possibilidade de relativização dessa exigência em hipóteses excepcionais, especialmente quando houver comprovação da eficácia e da segurança do fármaco por organismos internacionais reconhecidos, e quando o pedido de registro estiver pendente junto à Anvisa.

Nesses casos, é essencial que o advogado fundamente a excepcionalidade da situação com base em pareceres técnicos, laudos médicos e jurisprudência específica, demonstrando que a ausência de registro não decorre de experimentalismo, mas sim de omissão regulatória ou de burocracia administrativa, sendo o tratamento amplamente utilizado em outros países com resultados comprovados.

Considerações finais

A judicialização do direito à saúde, em especial no que se refere ao fornecimento de medicamentos de alto custo pelo SUS, não representa apenas uma reação individual a falhas estruturais do sistema público de saúde, mas configura também um mecanismo legítimo de efetivação de direitos fundamentais diante da omissão do Estado. O Judiciário, ao reconhecer o direito subjetivo à saúde, reafirma o compromisso constitucional com a dignidade da pessoa humana e a centralidade dos direitos sociais na ordem jurídica brasileira.

É papel do advogado, nesse contexto, atuar de forma técnica, responsável e comprometida com a defesa da vida e da integridade física dos pacientes, construindo ações bem fundamentadas, com provas robustas e alinhamento com a jurisprudência dominante. Mais do que garantir o acesso a um tratamento específico, trata-se de assegurar a prevalência de um valor essencial: o reconhecimento de que nenhuma limitação orçamentária pode se sobrepor ao direito de um ser humano de viver com dignidade.

No escritório Emanuely Cardoso – Advocacia, atuamos para garantir que pessoas que dependem de medicamentos essenciais não fiquem desamparadas. O fornecimento do tratamento necessário não é um favor do Estado — é um direito do cidadão, e nós estamos aqui para fazer valer esse direito. Entre em contato com nossa equipe e agende uma reunião gratuitamente com um advogado especializado.

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